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O IAB-Ba e o Gabarito da Orla Atlântica



Paulo Ormindo de Azevedo¹



 

O anúncio do Prefeito João Henrique de liberar o gabarito da Orla Atlântica pôs em foco uma discussão de há muito reprimida: o que fazer com a Orla Atlântica de Salvador? Estamos todos de acordo que a ocupação da nossa orla é uma das mais mesquinhas do país e precisa ser mudada. Desde a abertura da Av. Otávio Mangabeira, em 1949, o poder municipal nunca teve uma proposta ou zoneamento de sua ocupação e, por falta disso, permitiu que seus terrenos fossem transformados em uma colcha de retalhos de loteamentos unidomiciliares acanhados. A própria praia seria loteada e privatizada seguindo a lógica do clientelismo provinciano. O problema não é só da Orla Atlântica, como do Subúrbio Ferroviário, de Itapagipe, do Comércio e seu porto e da Encosta da Vitória, que deveriam ser objeto de uma política urbana única.

A discussão desses problemas, quando a cidade se ressente de novas áreas de expansão, é oportuna. Mas não nos esqueçamos que qualquer expansão urbana requer um planejamento integrado à toda cidade e implica em grandes investimentos públicos e privados. O Instituto de Arquitetos do Brasil/Departamento da Bahia – IAB-Ba, preocupado com a falta de uma política clara para essas áreas, realizou, entre 15 e 18 de Agosto passado, o Fórum Salvador e suas Frentes Marítimas, quando propiciou a discussão dessas questões com especialistas locais, de outros estados e, inclusive, do exterior. 

Nessas discussões, ficou evidenciado que os problemas da Orla Atlântica são mais complexos do que

parecem à primeira vista. O picadinho de lotes, feito há mais de meio século, pelos vendedores do sonho da  casinha de veraneio junto à praia, não corresponde mais às demandas de uma cidade com quase três milhões de habitantes, onde a casa e o carro privado não são, ou nunca foram, a solução.

Além do grave problema fundiário, a faixa compreendida entre as duas avenidas que se dirigem ao Litoral Norte não dispõe, hoje, de infra-estrutura adequada, especialmente sanitária e viária. A Avenida Paralela está saturada e a Otávio Mangabeira mais parece uma autopista que uma avenida beira mar, sem faixas de desaceleração, estacionamentos, passeios civilizados e acesso fácil à praia. Entre a Pituba e Itapoã há apenas quatro articulações entre as duas avenidas. Uma terceira via, capaz de aliviar o tráfego metropolitano em direção ao norte, é inviável.

Há questões ambientais, também, como a estreita faixa de praia sujeita a ressacas, como a que acaba de destruir barracas e trechos da própria avenida, do desaparecimento progressivo do coqueiral, que filtrava a salmora que corrói estruturas, revestimentos e o bolso dos moradores daquela área.

Para uma parte da nossa sociedade as mazelas da área se resolvem facilmente com uma palavra mágica: verticalização livre. Não é bem assim, aquele ecossistema tem seus limites de sustentabilidade. Sem estudos e simulações seus problemas podem se agravar. Verticalização, sem os devidos cuidados, significa adensamento, congestionamento de tráfego, destruição do verde, barramento do vento, aumento do barulho e do sombreamento, proliferação de barracas e quiosques.

Esta é, sem dúvida, uma área estratégica, senão a última, de desenvolvimento de Salvador. Para todos os problemas aqui apontados há soluções, mas que precisam ser estudadas, simuladas e discutidas com a comunidade. Exige, especialmente, a criação das bases para uma grande operação urbana público-privada, como as realizadas em São Paulo e outras cidades brasileiras para expansão ou implantação de linhas de metrôs. O Fórum Salvador e suas Frentes Marítimas revelou também que a par de seus problemas a área apresenta grandes possibilidades inexploradas, como a ampliação dos pequenos portos naturais, ali existentes, para incentivo à pesca e aos esportes aquáticos; alargamento da praia para evitar a fúria das ressacas, permitir mais espaço para o lazer e os esportes e viabilizar o alargamento de pistas, ciclovias  e passeios, hoje muito exíguos.

A área tem a possibilidade de abrigar núcleos turísticos e de lazer competitivos em nível nacional e internacional e conjuntos habitacionais de qualidade para os diferentes estratos da nossa sociedade.  Mas, para isso é necessário planejamento e lotes de terra adequados. Por isso, feitos os estudos necessários, onde for possível a verticalização este benefício deve ser condicionado a um remembramento prévio dos lotes de modo aos empreendedores poderem dispor de quadras inteiras para a implementação dessas novas funções.

Neste ponto cabe um esclarecimento. O IAB nunca foi contra o charme discreto de Ipanema e da Av. Atlântica, no Rio de Janeiro, com sua praia generosamente alargada e seus largos passeios desenhados por Burle Marx, mas sim o seu avesso, a arquitetura mesquinha das avenidas  N.S. de Copacabana e Barata Ribeiro com seus apartamentos de quarto e sala e pensões de três turnos.

Ou fazemos a coisa certa ou perdemos uma grande oportunidade de desenvolver a cidade. Para equacionarmos adequadamente estas questões é necessário que juntemos forças, como estão fazendo os pernambucanos, reunindo o Município, o Estado, a União e o setor privado para realizarem o Complexo Turístico-Cultural de Recife/Olinda. A Bahia tem agora as mesmas condições políticas. Estamos certos que não faltará ao nosso Prefeito e futuro Governador a vontade política de fazer a coisa certa.  


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¹ Presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil - IAB/BA

 
Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, Habitação e Meio Ambiente - SEDHAM
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